Sobrevivência Feminina: saiba como registrar ocorrência e receber apoio psicológico em caso de violência doméstica, em Presidente Prudente


Quarta reportagem da série explica como a vítima pode pedir ajuda através da Delegacia de Defesa da Mulher (DDM) e do Centro Especializado de Assistência Social (Creas). Portal g1 Presidente Prudente e Região publica a série de reportagens especiais ‘Sobrevivência Feminina’
Arte g1
O mundo parece parar e perde a vitalidade para a mulher que sofre agressões de um homem. Entre gritos de socorro, a lesão vinda de alguém que ela ama é sentida em silêncio. Dali em diante, começa a luta pela Sobrevivência Feminina.
Mas o pedido por ajuda deve romper a quietude e ser externalizado pela vítima em alto e bom som.
A quarta reportagem da série Sobrevivência Feminina mostra as principais ferramentas disponíveis para a vítima romper o ciclo da violência e acabar com as agressões.
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Delegacia de Defesa da Mulher (DDM), em Presidente Prudente (SP)
Bruna Bonfim/g1
Um dos meios mais comentados e eficazes é o denunciar o autor em uma Delegacia de Defesa da Mulher (DDM). Conforme a delegada titular da DDM de Presidente Prudente (SP), Denise Simonato, a vítima será ouvida e acolhida por funcionárias majoritariamente femininas.
“Tem essa política, essa orientação de que os funcionários das Delegacias da Mulher sejam preferencialmente mulheres, para fazer com que as vítimas se sintam mais acolhidas, mais a vontade na hora delas relatarem os problemas, as situações vivenciadas”, explicou a delegada ao g1.
Denise Simonato, delegada titular da Delegacia de Defesa da Mulher, em Presidente Prudente (SP)
Bruna Bonfim/g1
Uma vez que a mulher toma a decisão de denunciar, o trabalho das delegadas, escrivães e investigadoras começa de forma imediata.
“A vítima quando chega aqui, inicialmente ela vai registrar um Boletim de Ocorrência. Ela vai passar pela recepção, pelo atendimento, vai relatar os fatos e vai ser feito o registro inicial do Boletim de Ocorrência. Se ela comunicar que também deseja uma medida protetiva, também vai ser feito esse pedido, ela vai ser ouvida em declarações, vai ser feito esse pedido, nós encaminhamos esse pedido ao Fórum para que seja analisado judicialmente e, depois disso, vai ser instaurado um inquérito policial. Ela vai ser ouvida por uma escrivã de polícia e vão ser colhidas as provas, vão ser ouvidas testemunhas, vai ser ouvido o autor e depois de toda a investigação concluída nós encaminhamos o inquérito policial para o Fórum, para segunda análise, para a segunda fase processual”, descreveu Denise.
Vítimas podem solicitar medida protetiva nas Delegacias de Defesa da Mulher
Bruna Bonfim/g1
A medida protetiva tem como principal objetivo proteger a mulher que esteja em situação de risco, vulnerabilidade ou perigo. Ao ser concedida, o agressor fica proibido de aproximar-se da vítima, em qualquer lugar que ela esteja.
Desta forma, até que a mulher entenda que ela está correndo risco, a medida protetiva deve acompanhá-la.
“As medidas protetivas geralmente acompanham o curso do inquérito policial e depois do processo penal. Só que na verdade elas podem vigorar até o momento, a lei prevê que elas vigorem até que a vítima estiver sentindo em situação de risco, enquanto ela permanecer em situação de risco, as medidas protetivas vão vigorar”, ressaltou a delegada.
Delegacia de Defesa da Mulher (DDM), em Presidente Prudente (SP)
Bruna Bonfim/g1
Crescimento de Boletins de Ocorrências
A procura por ajuda tem aumentado a cada ano. Ainda segundo a delegada, o crescimento de registro de Boletins de Ocorrências de violência doméstica é considerado expressivo.
“Esse ano nós chegamos, até na semana passada, ao número de 2 mil B.O’s que foram registrados aqui ou encaminhados para gente, porque às vezes o b.o são registrados no Plantão, mas, como envolve violência doméstica, familiar ou crimes sexuais, são direcionados para a DDM”, explicou.
A delegada acredita que o aumento dos números se dá não apenas pelo possível crescimento da violência, mas sim pela procura por ajuda está se tornando cada vez mais recorrente.
“Acho que são diversos fatores que influenciam e não da para a gente cravar exatamente qual seja, mas nós acreditamos que esse aumento recorrente a cada ano de registro tem se dado pelo conhecimento da mulher, por ela estar procurando mais ajuda, pela mulher não estar se calando, por ela não estar mais se submetendo a situações de violência, acreditando que isso é normal, natural. Então a mulher está sendo cada vez mais informada, ciente dos seus direitos e procurando ajuda, comunicando às autoridades essas situações”, enfatizou Denise Simonato.
Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas), em Presidente Prudente (SP)
Bruna Bonfim/g1
Acolhimento e apoio
Mas o que fazer após registrar o Boletim de Ocorrência? Como superar esse trauma deixado no corpo e na alma? Um dos caminhos é procurar acolhimento e ajuda psicológica no Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas). Todo o serviço é oferecido de forma gratuita para a vítima.
A gerente do Creas, Elaine Cristina Dias, explica que um plano é traçado pela equipe multidisciplinar da unidade de acordo com o perfil da vítima e o trauma vivenciado.
“O Creas é uma unidade pública e dentro dessa unidade são oferecidos alguns serviços. Dentro de um contexto, é feito um plano de atendimento com essa mulher, vai identificando o que vai ser oferecido para a mulher, não só no âmbito do Creas, mas com relação ao âmbito de rede, fazer encaminhamento, qual serviço que essa mulher pode acessar. Dentro do Creas, a gente tem uma equipe interdisciplinar e essa equipe é composta por assistente social, psicólogo, advogado, monitor, onde eles fazem um trabalho de fortalecimento no contexto da mulher que vivencia violência”, explicou a gerente do Creas.
Dentre as atividades de fortalecimento, os profissionais do Creas apresentam a vítima o chamado Ciclo da Violência. Uma vez compreendido, é necessário rompê-lo para que as agressões terminem de uma vez por todas e evitar o estágio mais grave da violência contra a mulher: o feminicídio.
Gerente do Creas 1 de Presidente Prudente (SP), Elaine Cristina Dias
Bruna Bonfim/g1
Ciclo da Violência
Conforme a gerente do Creas, o Ciclo de Violência consiste em três fases:
Tensão: neste momento, a mulher age “pisando em ovos” com o agressor para tentar manter o relacionamento tranquilo, visto que ele fica irritado com coisas cotidianas praticadas pela mulher. “É sempre muito tenso, há um controle, um controle das suas roupas, de ter acesso a determinados locais, fica uma coisa micro”, ressaltou Elaine.
Explosão/Ato da Violência: nesta fase seguinte, o agressor extrapola os limites e pratica as violências contra a mulher. A agressão mais perceptível é a física, visto que deixa marcas no corpo. Porém, há outras violências que a mulher não percebe que está sendo violentada. “Muitas vezes, em um contexto de relacionamento, a mulher não identifica que ela está sendo vítima de violência sexual, pensando em um contexto de ‘sou mulher, eu casei e preciso ter relação sexual’, e não é isso”, enfatizou a gerente.
Lua de Mel: neste momento, o agressor se mostra arrependido do que fez e promete mudanças para receber o perdão da mulher. A vítima fica confusa com a dualidade de demonstrações de sentimentos do homem e, muitas vezes, reata o relacionamento por pressão da sociedade em ter uma família ou por realmente acreditar na mudança.
Após a última fase, o agressor realmente demonstra uma mudança de comportamento e a mulher se vê feliz por ter o perdoado. Porém, a calmaria costuma durar pouco. A tensão começa novamente por qualquer motivo fútil e todo o ciclo se repete.
“Para este rompimento, o trabalho do Creas é fortalecer essa mulher, fortalecer sua autonomia para ela conseguir reconhecer a situação e as formas que ela consegue romper, mas sempre é analisada junto com ela, até onde ela consegue ir, quais são as potencialidades que ela tem para que ela consiga romper e não entrar em outro relacionamento abusivo”, explicou a gerente do Creas.
Casa Abrigo acolhe vítimas de violência doméstica com risco de morte
Bruna Bonfim/g1
Casa Abrigo
Em algumas situações, a mulher quer romper o ciclo da violência, mas não tem para onde ir. Neste caso, o Creas pode encaminhá-la para a Casa Abrigo, que acolherá ela e seus dependentes menores de idade por um período de até seis meses.
“A Casa Abrigo foi instituída no município de Presidente Prudente, porém ela não é específica do município de Prudente. Ela envolve oito municípios, tem oito vagas, cada município tem uma vaga e tem mais uma vaga que a gente fala que é excepcional, que é comum a todos os demais municípios. Que situações vão para a Casa Abrigo? Questões de risco de morte. Ela vai para a Casa Abrigo para ser protegida e essa casa nem nós sabemos o endereço que ela fica no município, ela tem caráter de sigilo”, afirmou a gerente do Creas.
Creas também oferece serviço de acolhimento aos filhos de vítimas de violência de gênero, em Presidente Prudente (SP)
Bruna Bonfim/g1
Acolhimento aos filhos
Além da vítima, o cenário da violência doméstica também afeta os filhos que convivem no mesmo espaço. Portanto, o acolhimento deles é tão necessário quanto o da mulher.
“Se a gente for pensar dentro de um contexto doméstico, a violência contra mulher também afeta crianças e adolescentes pensando que dentro da lei nº 13.471, ela conceitua esse tipo de situação como violência psicológica, o Creas também atende dentro do contexto familiar. Se a mulher consegue romper essa questão, a gente consegue proteger as crianças. Vamos depender de um trabalho de sensibilização com essa mulher para que as crianças também sejam protegidas. Quando envolve crianças, o conselho tutelar também deve ser comunicado”, afirmou ao g1.
Em contrapartida, para o agressor, nenhum serviço de conscientização é oferecido pelo Creas atualmente.
“Dentro do município de Presidente Prudente, especificamente no atendimento para homens autores de agressões, nós não temos. Nós já tivemos há alguns anos, porém era um serviço voluntário, mas não conseguiu dar continuidade. Hoje não temos um serviço específico. Porém, caso o agressor reconheça que precisa de um atendimento, se faz sim o encaminhamento para uma unidade de saúde para eles avaliarem”, disse Elaine.
Denise Simonato, delegada titular da DDM de Presidente Prudente (SP)
Bruna Bonfim/g1
Mulheres ajudando mulheres
Por fim, salvar uma mulher da situação de violência doméstica só é possível através do trabalho exercido por outras mulheres. Como é o caso da Denise e da Elaine, que dedicam seus esforços para preservar ainda mais vidas femininas. No dia a dia, é inevitável não se sensibilizar com os relatos das vítimas.
“Olha, é muito difícil. A gente vê mulheres ainda passando por situações de violência, violência física, violência moral, psicológica. Mas, por outro lado, eu vejo que as mulheres estão ganhando força, estão se encorajando, estão buscando seus direitos, e eu fico feliz em ver essa evolução da mulher e até da sociedade em si, que estão deixando de ser uma sociedade patriarcal, que é uma coisa que veio desde a história da humanidade, e que a sociedade está encaminhando para uma sociedade igualitária”, enfatizou a delegada da DDM de Presidente Prudente, Denise Simonato.
Gerente do Creas, Elaine Cristina Dias, busca combater a violência contra a mulher até mesmo fora do trabalho
Bruna Bonfim/g1
Além do sentimento de indignação perante a injustiça praticada de um ser humano contra o outro, o trabalho no combate a violência doméstica proporciona um sentimento de fortalecimento no empoderamento feminino.
“São vários tipos de sensações. De indignação, me sinto mal por algumas situações onde você pensa ‘como alguém pode fazer determinadas coisas com pessoas’. Enquanto mulher, dá esse sentimento, mas também trabalhar dentro dessa temática me traz uma sensação de fortalecimento também, porque eu consigo muitas vezes levar além das orientações, aqui eu não atendo diretamente as mulheres, mas todos os casos discutimos em equipe, além dessas orientações que parte de mim para os profissionais do Creas, eu levo também até para minha vida pessoal, pensando em um contexto de relações dentro da minha família, do meu círculo de amizades, as vezes temos pessoas próximas da gente que vivenciam situações que não reconhecem. Que bom que eu posso contribuir com essas pessoas para ajudá-la a reconhecer determinados pontos e até mesmo orientá-la de alguns serviços que ela pode acessar”, finalizou a gerente do Creas,Elaine Cristina Dias.
Créditos da série Sobrevivência Feminina
Coordenação editorial e edição: Gelson Netto
Reportagem: Bruna Bonfim
Arte e ilustrações: Vanessa Vilche e Marcela Castilhos
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