Com início às 19h, no Coletivo Cultural Galpão da Lua, atividade nesta terça-feira (27) marca os nove anos da morte de Luana Barbosa, vítima de um tiro de pistola durante uma blitz da Polícia Militar do Estado de São Paulo, em 2014. Sarau homenageia memória de Luana Barbosa com música, poesia e encenações, nesta terça-feira (27)
Bárbara Munhoz/g1
“Sarau da Lua” é o nome do ato que movimenta a noite do Coletivo Cultural Galpão da Lua nesta terça-feira (27), ao lado da antiga Estação Ferroviária de Presidente Prudente (SP). Com início às 19h, a ação marca os nove anos da morte da atriz e ativista cultural Luana Barbosa, que foi vítima de um tiro de pistola, durante uma blitz da Polícia Militar do Estado de São Paulo realizada em 27 de junho de 2014.
No evento, que é aberto ao público, serão apresentadas músicas, declamadas poesias e encenados números circenses, de acordo com uma das organizadoras do sarau e integrante do Coletivo Galpão da Lua, Mari Palhares.
A estimativa é de que as apresentações sejam realizadas até às 21h, mantendo viva a memória e o amor de Lua Barbosa pelas artes.
“A gente quer lembrar da Luana como a pessoa que ela era. Uma pessoa incrível, uma pessoa super alto-astral, uma pessoa super batalhadora, sonhadora, uma menina linda, que tinha muitos sonhos e muita vontade de viver. Hoje, segunda-feira, dia 26, é aniversário da Luana. Ela estaria completando seus 34 anos. Neste momento, a gente quer lembrar dela como? Como a nossa Lua, a nossa amiga, por isso a gente vai fazer esse sarau amanhã, com a energia mais positiva que a gente puder, e mandar muita luz para ela de onde quer que ela esteja”, lembrou ao g1.
O Coletivo Cultural Galpão da Lua está localizado na Rua Júlio Tiezzi, número 130, no Centro de Presidente Prudente.
Sarau homenageia memória de Luana Barbosa com música, poesia e encenações, nesta terça-feira (27)
Bárbara Munhoz/g1
‘Violência policial’
Para Mari Palhares, não só os amigos, como a sociedade de um modo geral ainda são impactados pela morte de Luana Barbosa, já que “a violência policial é presente na sociedade brasileira”.
“Principalmente, mas não só, nas periferias das cidades, nas periferias do Estado, nós estamos na periferia do Estado, essas violências policiais são muito latentes. Todos os dias, a gente tem uma história muito semelhante com a da Lua”, observou.
Ainda de acordo com ela, as discussões em torno da morte da artista pairam sobre o grupo e também sobre a sociedade, transformando certas visões de mundo.
“A nossa vida muda muito quando isso acontece com a Luana, a nossa visão do Estado e da polícia, essa polícia que deveria servir para proteger, e é uma polícia que põe medo, a sociedade tem medo da força policial, então a gente fica o tempo inteiro nessa discussão, como sociedade, como grupo, que foi muito impactado com a morte da Luana também”, afirmou ao g1.
Atriz e produtora cultural foi morta por um tiro de pistola disparado durante uma blitz da PM, em 27 de junho de 2014
Arquivo pessoal
Caso Lua Barbosa
A atriz e produtora cultural Luana Carlana de Almeida Barbosa, conhecida como Lua, morreu no dia 27 de junho de 2014. Ela estava na garupa da motocicleta conduzida por seu namorado, o músico Felipe Fernandes de Barros, à época com 29 anos, e, por volta das 9h30, o casal passou por uma blitz policial na Avenida Joaquim Constantino, na Vila Formosa, em Presidente Prudente.
Na época, foi informado que o rapaz teria desobedecido à ordem de parada e, quando passaram pelos policiais, um deles, Marcelo Aparecido Domingos Coelho, atirou e a bala disparada perfurou o tórax da jovem passageira. Ela chegou a ser socorrida, mas não resistiu. Luana morreu um dia depois de completar 25 anos.
Desde então, foram vários desdobramentos. Tiveram inquérito, reconstituição, decisões judiciais e análises. Coelho alegou, segundo consta em um acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP), que o motociclista desobedeceu à ordem de parada na blitz e realizou uma manobra evasiva em sua direção. O policial ainda disse que sacou a arma e pensou que seria atropelado, que sentiu um impacto no braço quando ocorreu o tiro e que não tinha percebido que a arma havia disparado.
Já o motociclista, ainda conforme o acórdão, declarou que não parou na blitz por problemas de freio no veículo que conduzia, que o policial apontou a arma em direção ao seu peito com os dois braços esticados, que desviou do réu, que o militar atirou em sua namorada e que não houve qualquer impacto contra seu capacete.
Fato aconteceu durante uma blitz na Avenida Joaquim Constantino, em Presidente Prudente (SP)
Arquivo/g1
Investigações
As investigações da Polícia Civil concluíram que o caso se tratava de “dolo eventual”, ou seja, o policial militar não teve a intenção de matar, mas atirou sem prever o que poderia acontecer e as consequências disso.
“Após a análise do laudo pericial, pude entender que o Marcelo não mirou para matar ninguém. Mas, a partir do momento em que ele praticou a conduta, o policial assumiu o risco de produzir um resultado mais gravoso, no caso, a morte da Luana. Por isso, eu entendi que ele praticou a conduta de ‘dolo eventual’, mas pelo fato de ter levantado a arma na altura da cabeça do Felipe e a maneira que ele manuseou a arma de fogo”, explicou, na época, o delegado responsável pelas investigações, Matheus Nagano.
Júri popular
O policial militar foi a júri popular no dia 19 de outubro de 2022, em julgamento no Fórum da Comarca de Presidente Prudente. Na ocasião, o Tribunal do Júri desconsiderou a morte da atriz e ativista cultural Lua Barbosa como homicídio doloso, aquele em que há intenção de matar.
Segundo documento com a decisão do juiz Alessandro Correa Leite, “após instrução em plenário e respondendo aos quesitos formulados, os jurados afastaram a competência do Tribunal do Júri, desclassificando a imputação para o crime de homicídio culposo”.
Ainda conforme a decisão, “convém observar que os jurados não absolveram o réu”.
Familiares e amigos de Lua se reuniram em frente ao Fórum de Presidente Prudente (SP), local onde aconteceu o julgamento
Arquivo/TV Fronteira
Por fim, o juiz do caso decidiu que, “após a desclassificação efetuada pelo Tribunal do Júri, a Justiça Militar é a competente para apreciação do feito”, e determinou que “após o trânsito em julgado desta decisão”, fosse feita a remessa da decisão à Justiça Militar Estadual, “para prosseguimento em seus ulteriores termos”.
“Trata-se de processo para apuração do crime de homicídio doloso, de competência do Tribunal do Júri. Após instrução em plenário e respondendo aos quesitos formulados, os jurados afastaram a competência do Tribunal do Júri, desclassificando a imputação para o crime de homicídio culposo. Convém observar que os jurados não absolveram o réu, tese principal da defesa, responderam negativamente ao 3° quesito, relativo à absolvição. Porém, no julgamento do 4° quesito, relativo a culpa, tese subsidiária da defesa, os jurados responderam afirmativamente, afastando, portanto, a imputação de crime doloso. Uma vez afastada a competência do Tribunal do Júri, o processo deve ser julgado pela Justiça Militar Estadual, conforme art. 125, §5° da Constituição Federal, sendo o juízo Presidente do Tribunal do Júri incompetente para proferir sentença sobre o caso, conforme posicionamento do STF [Supremo Tribunal Federal], TJ/SP [Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo] e demais tribunais […]”, relatou o magistrado na decisão.
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‘Disparo acidental’
O argumento utilizado pela defesa do policial militar foi o de que “o fato se deu em decorrência de um disparo acidental, sem qualquer intenção de atingir a vítima”, ressaltou a advogada Renata Cardoso Camacho Dias, que atuou no júri popular junto aos advogados Gustavo Miguel Gorgulho e Tacito Alexandre de Carvalho e Silva.
“Importante dizer que o condutor da moto não obedeceu à ordem policial de parada, em três momentos sequenciais, e, pior, há fortes relatos de que acelerou a moto para empreender fuga! Assim, impossível falar-se em dolo e eventual”, informou ao g1 a advogada de defesa, no dia 18 de outubro.
Em nota ao g1, a Polícia Militar do Estado de São Paulo informou que Marcelo Aparecido Domingos Coelho foi demitido da instituição. Sobre o posicionamento a respeito do caso, que, na época, perdurava havia oito anos, a corporação esclareceu que “não comenta decisão judicial”.
Luana Barbosa morreu um dia depois de completar 25 anos
Marcos Barbosa/Arquivo Pessoal
Tribunal de Justiça Militar
Ao g1, o Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo (TJM-SP) informou nesta segunda-feira (26) que o processo envolvendo o policial Marcelo Aparecido Domingos Coelho não consta nos registros do órgão.
“Nos registros da Justiça Militar não consta o referido processo. Provavelmente os autos ainda não foram encaminhados da Vara do Júri para o TJMSP”, informou ao g1.
Defesa do réu
De acordo com a advogada de defesa, Renata Cardoso Camacho Dias, “o processo encontra-se em fase de recurso” impetrado pelo Ministério Público e aguarda decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP).
“Houve um julgamento pelo Tribunal do Júri de Presidente Prudente e, de forma soberana, pela sociedade de Presidente Prudente, respeitando os princípios legais e constitucionais, foi reconhecido que não houve homicídio doloso. Atualmente, o processo encontra-se em fase de recurso, aguardando uma definição a respeito da competência”, afirmou ao g1 a advogada.
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Arquivo/g1
Expectativa de justiça
Nove anos da morte de Lua Barbosa se passaram sem que o caso tivesse um desfecho. Para os amigos e companheiros de trabalho da atriz, a expectativa de justiça não existe mais.
“A nossa expectativa de justiça não existe. A gente não acredita que justiça vai ser feita, a gente não acredita que a memória da Lua vai ser honrada pela Justiça brasileira, mas a gente, de maneira nenhuma, vai deixar essa história cair no esquecimento, nem da cidade, nem do Brasil. A gente vai todo o tempo lembrar e a Lua será lembrada”, afirmou ao g1.
“Cerca de dois anos após a Luana ter sido assassinada, a Justiça Militar anulou o processo, e teria ficado por isso mesmo. Nós fizemos uma luta social muito grande, fomos atrás da Ouvidoria da polícia, Promotoria do Estado, a gente foi atrás de muita gente para conseguir levar o caso da Lua para júri popular. Ano passado, foi a júri popular. Foram 11 horas de julgamento, 11 horas que nós ficamos na frente do Fórum […]. Quando chegou ao final, o juiz se declarou incompetente para julgar o caso e o retornou para a Justiça Militar, essa que, uma vez, já anulou o processo. É como se o que aconteceu não tivesse acontecido”, relembrou.
Ao que depender do Coletivo Galpão da Lua e de seus parceiros, a memória da atriz e ativista cultural Luana Barbosa se manterá viva pela eternidade, sendo o sarau apenas uma das formas de demonstrar o amor e a gratidão que abraçaram essa história de amizade.
“Nós, do Galpão da Lua, temos uma relação com uma rede de teatro de rua do Brasil, que é a Rede Brasileira de Teatro de Rua [RBTR] e, durante todos esses anos, a rede sempre leva a memória da Lua por onde vai. Nós, amigos, companheiros de trabalho da Lua não vamos deixar que esse caso, mais um caso, caia no esquecimento, mas a expectativa de que a justiça dos homens faça alguma coisa não existe mais. É uma coisa que é muito doída para todos nós, e é por isso que a gente quer transformar essa dor, ressignificar isso”, concluiu Mari Palhares.
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Régis Garcete
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